quinta-feira, abril 20, 2017

Separação

Pablo separou da mulher.
Pediu pra passar uns dias em casa, chegou quarta-feira com o videogame e uma mala de roupa.
Perguntou algumas coisas, se eu tinha alguma diarista, como eu comia. Dei o numero do restaurante que me vendia marmitex e disse que vez em nunca eu chamava uma moça pra limpar. Perguntou se eu não tava comendo ninguém, dei risada.
Na sexta a noite, fui na casa do João jogar conversa fora e comer tremoço com cerveja. Contei pra ele que agora meu filho estava morando comigo, como era antigamente. Havia me dito que a mãe estava na Bahia com os parentes, que só por isso tinha ido para minha casa.
"E você não se ofendeu em saber que é a ultima opção do seu filho?" perguntou. Eu não me ofendi. Deve ser bem chato morar com um velho ranzinza de 60 anos que fuma e bebe como um gambá e só sabe reclamar de como São Paulo está ficando chata.
São Paulo está ficando chata. Se tem grafite reclamam, se não tem reclamam que não tem. Manifestação todo dia, que galera chata.
Mas até que algumas coisas vem para o bem. Eu por exemplo nunca mais peguei trem e metrô porque agora só ando de bicicleta.
Domingo eu levantei cedo e fui de bicicleta até a Vergueiro comprar uns legumes. Tenho saudades de quanto era vegano. Mas não tenho mais bolso para isso não, Tofu está caro, soja é caro.
Quando voltei, Pablo estava acordado só de cueca jogando videogame na sala. Já ia lá pelas 11h, agora eu entendia porque a mulher pediu separação.
Liguei para a mãe dele "Escuta aqui, você não vai voltar para São Paulo não? O Pablo ta aqui só de cueca na minha sala jogando Playstation" ela riu "Ai Aurélio, você sempre amoroso comigo e com seu filho né" e então me disse que demoraria mais algumas semanas para voltar.
Pablo me disse que ela estava casando pela segunda vez, com um cara de sua idade, um cara também divorciado, e também com filhos. E de repente eu me senti velho demais.
Quando conheci a mãe dele, ela tinha 21 e eu 39 anos. Eu já tinha uma barba branca de bode que levo na cara até hoje. Exibia Juliana ao meu lado tal qual uma joia, uma obra de arte. E ela era mesmo, e fazia eu me sentir com 21 anos também.
Mas acho que enjoamos um do outro, acabou o mistério e o companheirismo foi substituído pela obrigação de estar.
Aí um dia ela mudou e eu não liguei.
E eis que estou nessa vida até hoje.

"Nasci para satisfazer a grande necessidade que eu tinha de mim mesmo."
Jean-Paul Sartre

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